segunda-feira, 30 de maio de 2016

E, NO ENTANTO, É PRECISO DANÇAR

Se a inveja é um dos pecados capitais, sou um pecador.
Como eu invejo quem sabe sambar...
Nem precisava ser um Carlinhos de Jesus da vida.
Só saber fazer aqueles passos do samba miudinho já me deixaria muito feliz.
A verdade, porém, lhes digo, caros amigos: tenho a cintura dura.



https://www.youtube.com/watch?v=f-RLglyvrxM

Não que eu não dance.
Dançar separado (como a gente falava quando era novo) ou bem juntinho, numa música lenta no melhor estilo Motown, eu danço (depois de alguns drinks, melhor ainda).
Mas nas chamadas danças de salão sou uma negação, para imenso desgosto de minha mulher.
Só me arrisco com quem também não saiba dançar, aí os dois podem errar à vontade que está tudo certo.

Como não tenho dom da malemolência, fiquei deveras impressionado com o que vi durante as gravações que fizemos para o programa Caminhos da Reportagem no evento RIOH2K, na Cidade das Artes, no final da semana passada.



Para onde o olho apontava tinha gente dançando e dançando bem... Centenas, milhares...
O que me deixou mais pasmo foram os aulões e os workshops.
O coreógrafo fazia os passos, uma contagem doida e de repente umas 300 pessoas estavam repetindo tudo, tintim por tintim. E olha que cada movimento era mais cabeludo do que o outro.
Nem que eu passasse horas tentando conseguiria passar da primeira meia dúzia de passos.





Não saber dançar não significa, no entanto, não gostar de dança. E, apesar de me sentir como um Neanderthal numa feira de informática, gostei muito do que vi.
O prazer no olhar daquelas pessoas, a satisfação e os aplausos ao fim de uma sequência realizada com sucesso, a integração através da música e do ritmo, tudo era muito legal.



Por ser filho de uma bailarina clássica, a dança entrou na minha vida muito cedo. Não tenho a menor ideia a quantos espetáculos já assisti. No Teatro Municipal me sinto em casa, mas ali só poderia me apresentar, um dia, se fosse cantando (até que sou afinadinho), porque além da ausência de coordenação motora mais refinada, me falta também talento para o manuseio de qualquer instrumento musical.

Minha mulher me fez prometer que quando nos aposentarmos entraremos para uma escola de dança de salão. E assim será.
Só fico pensando em quanto irão sofrer a paciência do professor e os pés dela.

sexta-feira, 27 de maio de 2016

SILÊNCIO, JAMAIS!

Poderia começar esta postagem com aquele clássico chavão: “Há males que vêm para o bem”. Mas falar isso em relação a um estupro é impensável, por mais que ele tenha mobilizado tanta gente em torno da discussão sobre o tema em nosso país.

Que vivemos em uma sociedade machista é óbvio.
Que a polícia e a justiça fazem vista grossa em diversos casos de violência contra as mulheres, também.
Então como lutar contra a Cultura do Estupro?



Acho que a saída, como 90% por cento dos graves problemas de nosso país passa pelas escolas, pela educação, pela informação e pelo debate.
Remover o tapete para onde questões como essa eram (e são) varridas tem que ser a primeira medida.
A boa notícia é que, tendo a informação como munição, vêm surgindo cada vez mais grupos de debates em escolas e universidades, os chamados coletivos femininos, ou feministas, como queiram.
Livres das amarras do enorme preconceito, debatem as questões que lhes afetam direta e indiretamente.


Como já disse Tom Jobim, certa vez: “O Brasil não é para principiantes”. Apesar de possuir uma sociedade conservadora, tacanha e presa a velhos conceitos sociais, ao mesmo tempo, se mostra extremamente permissivo com alguns temas. É como se tivéssemos um pé no século XIX e outro no XXI. Se falarmos em termos de questões comportamentais, então, isso fica ainda mais claro. Condena um beijo gay numa novela, mas aceita as cenas mais tórridas de sexo na telinha.

Portanto quanto mais cedo as meninas tiverem contato com temas que as afetam diretamente como assédio físico e moral, misoginia, machismo, abuso sexual, gravidez, doenças sexualmente transmissíveis, aborto e responsabilidade sobre o próprio corpo, melhor.



Com certeza há quem não ache isso, até mesmo pais e mães de meninas, o que me parece inconcebível. Acham que podem criar uma bolha protetora ou coisa assim. Mas o mundo é duro e real e bolhas não resistem a ele.

Tenho uma filha de quase 19 anos. Ela faz parte, como ex-aluna, do Libertinas, coletivo do Colégio São Vicente de Paulo, no Cosme Velho
Tenho alunas na Uerj que se uniram para criar um coletivo feminino na Faculdade de Comunicação Social.
Fico feliz que seja assim.

Elas nada têm a perder com essa união. Com a internet como aliada, trocam ideias e trazem à luz questões que tanto lhes são necessárias e que a sociedade hipócrita tenta esconder nas sombras.
A coisa, porém não é simples.

Haverá sempre aqueles que demonizem essa união, aqueles que critiquem, desmerecendo o movimento. Pessoas que vão estar retroalimentando velhos chavões sobre o “real papel da mulher na sociedade”. E o que é pior é que, entre elas, você encontrará mulheres batendo nesta tecla.



Que as meninas, as jovens, as mulheres continuem se unindo em prol de seus direitos, que continuem trazendo temas de seus interesses para o centro da discussão.
O silêncio jamais ajudou a mudar qualquer coisa.


Links interessantes:
Mapeamentos de coletivos de mulheres criado pela Universidade Livre Feminista: 




quarta-feira, 25 de maio de 2016

INCOMPETÊNCIA

Confesso!
Sou um professor incompetente!
Vinte anos após ter começado a lecionar na Universidade do Estado do Rio de Janeiro chego a esta conclusão.
Não consegui fazer o que toda nossa categoria conseguiu, de acordo com ícones da pós-modernidade democrática brasileira como Alexandre Frota, Janaína Paschoal e o representativo movimento “escola sem partido”: doutrinar alunos para o comunismo e contra a família, a tradição e a propriedade.
Por mais que expusesse minhas ideias em sala de aula, não consegui fazer uma lavagem cerebral em meus alunos. Não, eu não consegui doutriná-los, sr. Frota!




Nenhum deles... Nenhum sequer, em duas décadas de magistério, entrou em sala de aula cantarolando a Internacional. Nenhum recitou O Capital ou queimou um crucifixo em sala de aula.
Não consegui transformá-los em seres teleguiados a serviço da esquerda ou de ideias revolucionárias.
Também não fui capaz de perseguir ou reprovar alunos que não concordavam com meus argumentos.
E o que é pior...
Tem sempre um pior, não é.
Acabo de vasculhar as listas dos mais procurados do FBI, da Interpol, da Polícia Federal e da Secretaria de Segurança do Estado do Rio de Janeiro e não encontrei o nome de nenhum aluno que passou por mim.
Não, preclara causídica Janaína Paschoal, não fui capaz de formar aqueles guerrilheiros que saem todos os semestres das universidades brasileiras. Aqueles que você, quase em lágrimas (ou quase em êxtase) denunciou em frenesi, em meio às argumentações pró-Impeachment.




Sou muito incompetente!
Matematicamente, pelo número de alunos que já assistiram às minhas aulas, deveria haver, no mínimo uns dois ou três elementos de altíssima periculosidade social; quiçá um terrorista internacional.
Mas não consegui.
E, agora, não mais conseguirei tal feito.
Novas leis vêm aí. Já estão sendo aprovadas em alguns estados.
Professores não poderão mais emitir opiniões dentro de sala de aula. Terão que se ater a colocar a matéria no quadro negro (ou branco, atualmente).
Perguntas feitas por alunos não poderão ser respondidas de imediato. Antes, será preciso consultar o departamento jurídico da universidade para descobrir se a reposta irá, ou não, ferir a lei; se o professor poderá, ou não, ser punido.
Escola é lugar para aprender e não para pensar, defendem os paladinos da nova educação.
Pensar deve ser, mesmo, muito perigoso...

quarta-feira, 18 de maio de 2016

A ZONA SUL DA ZONA NORTE

Fui criado em Copacabana.
Durante 25 anos passei por vários endereços: Henrque Oswald, Lacerda Coutinho, Maestro Francisco Braga, Silva Castro e Tonelero. Sempre entre Siqueira Campos e Santa Clara.
Sempre no Posto 3.
Hoje, quando circulo por aquela área, restam poucas lembranças de meus tempos por lá.
Cinemas, lanchonetes, comércio... Quanta coisa mudou.



Mas não foi apenas meu antigo bairro que passou por toda essa transformação trazida pelo correr dos anos.
Hoje, por conta de um conserto no carro, dei uma circulada pela Praça Saenz Peña, na Tijuca.
Nunca fui de frequentar a área, algumas vezes apenas, para ver algum filme em cartaz. Tal como em Copacabana, eram muitos cinemas por lá. Hoje, no entanto, salas de exibição na Tijuca, só em shopping.
Pouco ainda resta de meu imaginário daquela Tijuca. Dos locais que conheci quando novo.


A velha Drogaria Granado continua por lá, com seu lindo prédio, assim como a estátua em homenagem ao criador da ginástica pelo rádio, que sempre me chamou a atenção.


Fico imaginando como deve doer no coração dos tijucanos ver o grandioso Cine Carioca ter virado uma Igreja Universal ou que do Café Palheta só tenha restado um balcão dentro de uma Drogaria Venâncio (são 3 no entorno da praça e mais duas bem próximas).


Como dizia aquele samba da Caprichosos de Pilares: "Velhos tempos que não voltam mais".

Tempos que têm apenas os velhos sobrados e gente saudosa como testemunhas.


segunda-feira, 16 de maio de 2016

NATURAL, NATURALMENTE...

Não sei se algum de vocês viu o filme "Golpe Duplo", com Will Smith.
Numa cena ele mostra como fazer para induzir um sujeito a uma aposta. Durante um bom tempo o cara vai se deparando com aquele número nas mais diversas situações e acaba mordendo a isca.


Tem certos temas que ficam se insinuando bem assim.
Peças de um quebra-cabeças que vão surgindo espalhadas, como que a pedirem para serem unidas.
A primeira delas veio numa postagem de um querido casal de amigos sobre mais uma tirada genial da filha Manu. Reproduzo:

- Mamãe, homem não pode ficar grávido?
- Não...
- Mas e se o homem for casado com outro homem?
- Aí eles podem adotar uma criança.
- Mas nem se eles pedirem pra Deus?
Não tá certo isso...

Se não me engano, a autora da pérola acima ainda não tem 5 anos.

O comentário poderia fazer parte de uma velha seção da falecida revista Pais & Filhos chamada “Criança diz cada uma”. Só que o curto diálogo entre mãe e filha é muito mais simbólico do que pode parecer.



A inocência de Manu nos mostra como pode ser natural aceitar que haja um casal formado por dois homens. Não há nela qualquer filtro moral que a faça rotular isso como uma coisa errada. E talvez só mesmo com as novas gerações essa questão não seja algo tão relevante que valha um textão no Facebook ou tanta polêmica pelo mundo afora.

E como há, ainda, gente temerosa sobre como as crianças podem encarar essa nova realidade social. A crítica da vez é contra a Ideologia de Gênero, uma suposta "ditadura gay" na educação brasileira.
O combate à homofobia ou a simples busca de igualdade entre sexos nas escolas é tratado por religiosos ou por parlamentares da Bancada da Bíblia como um incentivo ao homossexualismo.
Vejam uma explicação deles sobre o tema no link abaixo:



E o que é pior é que o Ministério da Educação, pelo que parece, também vai fazer parte desse coro. 
No Facebook, a psicóloga cristã, Marisa Lobo, autora do livro “A ideologia de gênero na educação”, descreve o diálogo que teve com o Ministro da Saúde, Ricardo Barros. Segundo ela, Barros afirmou que o MEC agora pertence do DEM e que isso vai acabar.


Como subestimam a inteligência das crianças...

Se não forem elas, quem nos livrará desse preconceito tão arraigado?
Atire a primeira pedra aquele que, mesmo sendo contrário a qualquer tipo de discriminação, não tenha se flagrado diante de algum pensamento preconceituoso, mesmo que tenha se condenado segundos depois.

Não é fácil, não. 
Eu, mesmo defendendo aqui o direito de cada um amar quem bem lhe aprouver, vivo esbarrando em meus preconceitos, ainda que tente domá-los. Afinal foram anos e anos exposto a uma cultura homofóbica.

Querem um exemplo clássico?
O futebol.
Quantas vezes não gritei, no Maracanã: “ÔÔÔÔ, todo viado que eu conheço é tricolor!” ?
Quantos juízes não xinguei de viado?
Ou nos tempos mais comportados, de “bicha”?

Vai sempre ter alguém que argumente que arquibancada de futebol é lugar de catarse e que ali as pessoas só falam da boca pra fora. 
Só que não é bem assim, só gritamos assim porque há o preconceito. Porque acreditamos que dessa forma estamos ofendendo o adversário ou o juiz ou quem quer que seja.
Se chamar de gay, viado, bicha ou sapatão é ofensa, então há preconceito, sim senhor.



Não há dúvidas que o futebol e o homossexualismo são como água e óleo, pelo menos por cima dos panos. A revista Vice publicou um ótimo artigo sobre o tema: “Por que o futebol brasileiro ainda está trancado no armário?”, escrito por Letícia Naísa e Peu Araújo. 



O artigo também fala da função da mídia na propagação da homofobia, ainda que de forma indireta, na forma de ironias ou de críticas veladas. 
Nos últimos dias houve um estardalhaço por conta de declarações da apresentadora de TV Patrícia Abravanel, filha de Sílvio Santos. No programa do pai ela declarou que não considera normal uma relação homo-afetiva:

“Acho que a gente tem que ensinar para o jovem de hoje que homem é homem, e mulher é mulher. E se por acaso ele tiver alguma coisa dentro dele que fale diferente, aí tudo bem. O que está acontecendo é que estão falando que tudo é normal, tudo é bonito, o jovem acaba experimentando coisas que pode vir eventualmente a se arrepender depois.” 



Lógico que logo as redes sociais explodiram com críticas ferozes e manifestações de apoio inflamadas. Só que isso, ao invés de gerar um debate construtivo, acaba virando guerra.

A fala da moça, que é uma comunicadora de massa, para mim soa estranha. Parece que os jovens estariam correndo risco de contágio. Algum tipo de vírus que, se em contato com a pessoa, inverteria sua opção sexual “natural”. Algo totalmente irreversível. Um caminho sem volta.

Se o jovem ou o adulto sentir vontade de estar com outro homem, com outra mulher, com um trans, com vários de cada vez ou todos de uma vez só, isso é uma opção dele. Baste que se cuide, que use camisinha ou que se previna contra uma gravidez indesejada. Fazendo isso, por que ele se arrependeria depois?

Numa sociedade conservadora como a que ainda vivemos, a forma mais comum de combate ao homossexualismo é a associação com o pecado. Seria contra as escrituras, dizem... Mas o próprio Papa Francisco defende o acolhimento aos homossexuais como filhos de Deus e conclama a Igreja a compreender a sociedade moderna.

Por que, então, temos que continuar a ver rapazes sendo espancados porque andavam abraçados na rua? Ou meninas sendo humilhadas por trocar um selinho em público?



Tanta coisa mais grave pra gente se preocupar, tantos problemas para resolver e tem gente preocupada com a felicidade dos outros.

Não! Não há uma Ditadura Gay sendo implantada no Brasil ou no mundo.
Não! Gostar de alguém do mesmo sexo não é uma aberração.
Não! Ninguém deve se intrometer na vida particular dos outros.

Se as pessoas se convencerem disso ou se pelo menos se conformarem de que o mundo é mais complexo do que a caixinha em que vivem, a geração da Manu vai viver num mundo bem mais harmônico e feliz

PS: Não! Eu não sou homossexual. Mas se fosse, ninguém também teria nada a ver com isso.


quarta-feira, 11 de maio de 2016

UMA MORTE PUBLICADA (E TELEVISIONADA)


UMA MORTE PUBLICADA (E TELEVISIONADA)

Abrem-se as cortinas para mais um ato do Impeachment.
A decisão do plenário do Senado de dar prosseguimento ao processo não surpreenderá ninguém.
Servirá para afastar Dilma Rousseff por pelo menos 180 dias, até que uma nova votação determine seu destino final.
Nesse período é estabelecido um governo de transição do vice, Michel Temer.
Vários de meus amigos comemorarão este dia. O dia em que o PT foi afastado do poder depois de três mandatos e meio, todos eles legitimamente eleitos em pleitos livres e democráticos.

Dizem que este foi o período mais corrupto da história do país.
Será mesmo?

Não estou aqui para defender o PT.
Acho, como já disse várias vezes, que o partido teve oportunidade de mudar a política no Brasil e acabou por repetir velhas práticas de governos antecessores.
O Brasil melhor que aqueles que elegeram Lula e Dilma queriam ficou pela metade.

No entanto, dizer que o PT não fez nada de bom é de uma miopia política passível de bengala branca e cão guia.
O jornalista político Kennedy Alencar faz um interessante balanço:
"No período Lula, houve uma projeção internacional do país que resultou numa melhora da imagem do Brasil perante o mundo. A própria corrupção que contaminou o PT veio à tona com notável contribuição do partido. A modernização da Polícia Federal e uma relação de respeito ao Ministério Público Federal, acabando com a figura do engavetador-geral da República, foram fundamentais para levar à prisão figurões da política e do empresariado que sempre escaparam da Justiça."

O PMDB, sanguessuga persistente, presente em todos os governos desde o retorno democrático, mais uma vez ocupará a presidência, sem jamais ter sido cabeça de chapa Sarney, Itamar e Temer).
O que virá a seguir? Ninguém sabe.

Há quem acredite em novos tempos. Na deposição sistemática dos corruptos, sejam eles quem forem.
Há quem acredite num Brasil melhor.

Depois de ter contornado o cabo dos 50 anos me vejo, hoje, como um homem cético. E, neste caso, especificamente, nada otimista.
Não me surpreenderão notícias futuras como a da privatização do Petrobras, uma forma de restabelecer a credibilidade da companhia ou se mudarem os critérios de exploração do Pré-Sal, favorecendo petroleiras estrangeiras, com a desculpa de que o Estado deve ter outras prioridades.
Não me espantarei se programas sociais criados pelo governo petista forem, aos poucos, sendo suprimidos; se a luz não chegar mais ao interior remoto do país, se o bolsa-família for taxado de assistencialismo e eliminado, se os programas de crédito educativo forem esvaziados, se forem canceladas as cotas em universidades públicas.
Muita gente que apoia o Impeachment aplaudirá as medidas pois elas não as afetam diretamente.

Os que querem ver Dilma e, principalmente Lula, pelas costas (ou atrás das grades) alegam que a inflação subiu, que o crédito e os investimentos diminuíram, que hou maquiagem no superávit primário e que o desemprego galopa, além de outras alegações mais ou menos subjetivas.

Foram muitos os erros do governo, com certeza, mas cabe a pergunta, até que ponto a discordância de parte da sociedade (principalmente políticos, mídia e empresários) com um novo mandato do PT não ajudou a parar o país e agravar a situação?
Votações emperradas, investimentos retidos e baterias abertas nas trincheiras midiáticas não teriam contribuído para o quadro em que estamos? Ou posso ser chamado de irmão mais novo de Urbano, o paranoico, personagem antológico de Henfil?

Um mandato ainda que mediano de Dilma abriria a possibilidade para a volta de Lula. E mais quatro ou oito anos de PT no poder era um risco que esta outra metade do Brasil não queria correr.
Deu no que deu.

Golpe ou não, o fato é que o resultado de uma eleição está prestes a ser jogado no lixo, assim como algumas garantias democrática, como expõe duramente em seu artigo o professor Gabriel Priolli:
"Encerra-se nesta data o período de plenitude democrática inaugurado no país em 5 de outubro de 1988, com a promulgação da “Constituição Cidadã” ora revogada pelo impeachment da Presidenta Dilma Rousseff. Inicia-se um regime plutocrático de completa incerteza política e jurídica, em que as garantias constitucionais e legais serão exercidas seletivamente, em exclusivo benefício dos donos do poder e em prejuízo de tudo que representar as forças populares."

A ópera segue seu roteiro pré-estabelecido.
Os atores principais são trocados e a valsa não para.

O povo?
Ele já fez seu papel (na verdade, o papel que a mídia esperava dele).
Que aguarde agora as próximas eleições observando o que virá por aí.

Em dois anos e meio dá pro PMDB e seus aliados fazerem muita coisa (e muita coisa errada também).
A pressa deles é grande, afinal, como diria aquele personagem caricato de novela: "O tempo ruge, a Sapucaí é grande" e 2018 está logo ali.


Na dúvida, mulheres e crianças primeiro...


segunda-feira, 9 de maio de 2016

A ÚLTIMA DO MARANHÃO



Mais perdido que cego em tiroteio?
Mais sem rumo que cachorro que caiu de caminhão de mudança.
Mais enrolado do que papel higiênico.

Pode escolher a expressão mais adequada.
Qualquer uma vai servir para explicar a situação da população brasileira nesta segunda-feira, dia 9 de maio de 2016.

A decisão do presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão, de anular as sessões que aprovaram o prosseguimento do processo de impeachment de Dilma Rousseff teve o impacto de uma daquelas bombas de efeito moral.
Explodiu tão perto do ouvido da gente que estamos todos desorientados..

A grita é geral.
Jornalistas, ao invés de analisar, panfleteiam.



Redes sociais em polvorosa.
O FLAxFLU incendiou de novo.

Hipóteses não faltam:
- O ato de Maranhão teria sido, na verdade, comandado por Cunha. Uma retaliação contra a falta de reação do PMDB com sua saída
- O presidente interino teria recebido propina do PT.
- Waldir Maranhão teria comprado dólares e tomou a decisão para agitar o mercado e vender as doletas na alta.
- Maranhão quis apenas aparecer. Estes teriam sido seus 15 minutos de fama.

Agora, se nós que aqui habitamos não estamos entendendo patavinas, imaginem a imprensa lá de fora, os investidores...



O processo de impeachment não é uma causa contra a corrupção. Nunca foi. É um jogo de poder e um jogo cheio de pantomimas e dissimulações. Um jogo que, independente do lado em que cada um esteja, só há perdedores no final.
É como disse meu amigo Marcelo Castilho: “E os roteiristas de House of Cards e Game of Thrones se ralam de raiva....”

Não faltam piadas a respeito.
Mas acho que o riso é mais de nervoso do que da graça dos memes e postagens que pulularam na Rede.



O país precisa de grandeza, concórdia, esforço coletivo, mas estamos cada vez mais rachados, divididos, esfacelados.


Sem querer dar uma de profeta do fim dos tempos, deixo penas a pergunta: quem ganha com isso tudo?


sexta-feira, 6 de maio de 2016

OS SEM-TOCHA

Faltam 3 meses para que a pira olímpica seja acesa no Rio de Janeiro.
A tocha, por sinal, anda perambulando pelo país. Em sua rota estão mais de 300 cidades e os 27 estados do país. Um total de 20 mil quilômetros em terra e 10 mil milhas aéreas
Ao todo, serão 12 mil pessoas participando do revezamento.



Uma coisa bacana pensada pelo Comitê Rio 2016 e pelos patrocinadores da jornada (Coca-Cola, Nissan e Bradesco) foi incluir no revezamento pessoas que fazem a diferença, seja no esporte ou em suas comunidades.
Gente como Tatiana Solanca, que emagreceu 30 quilos para doar parte de seu fígado para uma criança que não conhecia, no interior de Santa Catarina.
Ou a professora Maria do Socorro Lopes que incentiva o aprendizado com contação de histórias em Itabuna, na Bahia.
Ou ainda, Dalton Neves, de Maceió, que criou um barco museu que navega pelas águas do Rio São Francisco.
São milhares de histórias legais de superação, inspiração, respeito, dedicação, igualdade e excelência e isso é um ponto positivo.
O lado negativo dessa história é a falta de organização do Comitê Olímpico Brasileiro para incluir nessa lista todos os atletas brasileiros que já nos representaram em Olimpíadas, medalhistas ou não.
Pode até parecer muita gente, mas não é.
Segundo um levantamento da professora Katia Rubio, autora do livro “Atletas Olímpicos Brasileiros”, dos 1.796 integrantes de delegações olímpicas de todos os tempos, 1.478 estão vivos, mas menos de 700 em condições de carregar a tocha.


Ou seja, pouco mais de 5% do total de participantes do revezamento.
Foi Katia quem desencadeou a campanha #todoatletaolimpicodeveconduziratocha.


A iniciativa surgiu depois das dezenas de mensagens que recebeu de atletas que tinham sido “barrados no baile”.
O impacto foi grande. Logo a professora foi procurada pelo Comitê, que garantiu que aqueles que nos representaram em Olimpíadas não seriam esquecidos e avisava que havia um e-mail para que os mesmos se inscrevessem...


O problema é que isso só se deu ás vésperas do começo da trajetória da tocha em terras tupiniquins.
De lá pra cá, tenho acompanhado o desenrolar dessa história e visto que alguns estão tendo sucesso no cadastramento e outros não.
Quando, recentemente, fiz um comentário questionando se a iniciativa não teria sido “só para inglês ver”, fui retrucado quase que de imediato por alguém da organização garantindo que não. Mas o fato é que, na prática, muita gente ficou e ficará a ver navios.
Um exemplo já se deu em Brasília onde a tocha fez um roteiro estrombólico para agradar aos patrocinadores. No início da tarde passou por um bairro chamado SIA (Setor de Indústria e Abastecimento) para visitar a uma concessionária da Nissan, depois percorreu quase 20 quilômetros até o final de Taguatinga, para passar pela fábrica da Coca-Cola e por fim voltou ao Plano Piloto, para poder ir até o prédio à sede do Bradesco. Na capital federal, vários atletas olímpicos só puderam estar com a tocha por conta de uma iniciativa do corredor Joaquim Cruz, como mostra o vídeo publicado no blog de Daniel Brito, no UOL.  (http://blogdobrito.blogosfera.uol.com.br/2016/05/06/joaquim-cruz-empresta-tocha-a-atletas-esquecidos-pela-rio-16-no-revezamento/)
A tocha de Joaquim foi compartilhada por ex-atletas como o atacante da seleção olímpica em Montreal-76, Jarbas Tomazoli, Claudia Chabalgoity, tenista que disputou duplas em Barcelona-92, Leandro, levantador da equipe então campeã olímpica em Atlanta-06, o meio fundista Hudson de Souza, com três participações nos Jogos e pivô Pipoca, do basquete, com o mesmo número de participações.


Muita gente, infelizmente, teve/terá suas vagas ocupadas por autoridades, amigos das autoridades, amigos dos amigos, além de celebridades e pseudo-celebridades.
Nada contra a dupla sertaneja Zezé de Carmargo e Luciano carregar a tocha olímpica, mas é inconcebível que brasileiros que defenderam nossa bandeira nos Jogos fiquem de fora.


Se não se pensou nisso antes ou se não houve um planejamento adequado, ainda dá tempo de corrigir, pelo menos parcialmente, esta falha.
Uma Olimpíada é antes de mais nada um evento esportivo. Uma celebração à dedicação de grandes atletas, de ontem, de hoje e de sempre.



segunda-feira, 2 de maio de 2016

O ENGRAXATE E A NOVA CUBA

Uma coisa que adoro fazer quando flano pelo Centro do Rio é sentar numa daquelas cadeiras altas de engraxate.
Enquanto o pisante recebe um trato, fico observando o vai e vem das pessoas, o pulsar da cidade.
Recuso jornal ou revista, prefiro bisbilhotar aquele mar de gente, o andar, o vestir, o comportamento de cada um e do todo.
Já tive alguns engraxates fixos, como o Tião na esquina de Senador Dantas com Francisco Serrador, muito bom por sinal.
As trocas se dão pela proximidade deles com meu local de trabalho.
Atualmente, quem cuida de meus sapatos é o Seu Joel.


Seu ponto é mais que uma cadeira de engraxate. Em frente ao Teatro Carlos Gomes, ali na Praça Tiradentes, ele mantém, também, uma oficina de sapateiro e uma sapataria de calçados usados. Tudo num espaço de uns 3 metros quadrados, que aparece até no Google Maps.


Seu Joel engraxa com capricho, sem pressa.
Segundo ele são cerca de 50 anos fazendo isso.
Gosta de papo, mas não de prestar serviço de informações. É impressionante como as pessoas preferem perguntar do que olhar placas de sinalização. Um misto de preguiça e insegurança, creio eu.
Na cabeça ou pendurada na cadeira está sempre uma boina de ex-combatente do exército.


Achava que seu Joel fosse ex-pracinha, mas hoje descobri que não.
Se tivesse feito as contas veria que aquele senhor não poderia ter servido na Itália. Teria que estar com quase 90 anos e, definitivamente, ele não tem tanta idade.
Me contou que participou durante dois anos de uma missão comandada pela OEA na República Dominicana.


Como nunca tinha ouvido falar dessa ação militar, fui pesquisar.
Pouco depois do Golpe Militar brasileiro completar 1 ano, o governo brasileiro retribuiu a gentileza do apoio norte-americano durante o processo de deposição de João Goulart enviando cerca de mil e trezentos soldados para participar, ao lado de tropas dos EUA e de outras ditaduras latino-americanas como o Paraguai (de Alfredo Stroessner) e a Nicarágua (sob comando de Anastácio Somoza), de uma suposta Operação de Paz da Organização dos Estados Americanos na ilha.
O que historiadores daqui afirmam é que havia o temor que o país seguisse o exemplo dos vizinhos e transformasse em "uma nova Cuba".


De acordo com a versão das Forças Armadas, a Força de Paz da OEA visava restaurar a normalidade na República Dominicana, garantir a segurança de seus habitantes, a inviolabilidade dos direitos humanos e o funcionamento das instituições democráticas em um país onde não havia um Governo legítimo e no qual dois grupos fortemente armados lutavam abertamente pelo poder, deixando a população desamparada e encurralada.



O que consta nos livros de história, no entanto é que a Guerra Civil de 1965 na República Dominicana, também conhecida como a Revolução de Abril, começou quando um grupo de jovens oficiais do exército e da polícia tentaram restaurar o governo constitucional do presidente Juan Bosch, primeiro governante democraticamente eleito depois da execução do ditador Rafael Leónidas Trujillo, que ficou 31 anos no poder. Bosch tivera seu mandato interrompido por um golpe de Estado em Setembro de 1963.




Como as ideias de Juan Bosch estavam muito mais próximas do pessoal de Sierra Maestra do que do Tio Sam, a OEA tratou de enviar “socorro” ao país caribenho.

Não sei se Seu Joel tem noção de tudo isso.
Se conhece ao certo as razões do tempo que passou por lá.
Quem sabe na próxima engraxada possamos conversar mais sobre o tema.

domingo, 1 de maio de 2016

COM A PERNA NO MUNDO

No longínquo ano de 1981, após passar no vestibular, embarquei num velho ônibus da Itapemirim, junto com o amigo Marcos Cruz, rumo ao Nordeste. Era a primeira vez que viajava por conta própria, dono de meus destinos.


A carga era pesada. Barraca, fogareiro, panela...
A grana era curta e a ideia era acampar onde desse e fazer a própria comida.
Foram muitos perrengues, histórias que viraram folclore pessoal. Como a da bolsa com cheques de viagem e máquina fotográfica que ficou me esperando, durante horas, no meio-fio de uma estrada, até que eu voltasse para resgatá-la.
A viagem foi mais curta do que imaginávamos.
A intenção era chegar até Belém, mas a grana acabou em Natal. Mesmo assim foi uma jornada inesquecível. Foi ali que descobri realidades que desconhecia. Vi como era o meu país por dentro. Conheci muita gente; cresci.


Hoje é minha filha que bota a perna no mundo. Um mês fora.
A distância é maior, do outro lado do mar.
Outra cultura, mas os mesmos desafios. Se virar, descobrir, desvendar, fazer seus caminhos.
Clara sempre foi uma grande companheira de viagem e conforme crescia foi participando cada vez mais dos planejamentos, das garimpagens dos locais aonde íamos.
De acompanhante, passou a navegadora e nas últimas já tirava onda de guia. Portanto, tenho certeza de que está pronta para o que der e vier.


A saudade vai ser amenizada pela tecnologia. Whatsapp, Facebook, Skype...
No meus tempos era só orelhão mesmo. E ás vezes nem falava para economizar na conta telefônica. Quando a gravação mandava dizer o nome e a cidade de onde estava falando. Dizia que estava tudo bem, onde estava e desligava.
Para minha mãe, o jeito era rezar para que tudo corresse bem e relaxar.
É o que farei nesse mês.