segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Em defesa dos bondes


 Tenho um enorme carinho pelo bairro de Santa Teresa. Um namoro que começou nos tempos da Faculdade, quando percorri as charmosas ladeiras ao lado de alguns colegas que filmavam um documentário chamado “Por lá não se passa”. Uma referência à localização geográfica do bairro, que é mais um destino do que um local de passagem. (Curiosamente, hoje passo sempre por lá para encurtar o tempo do trajeto entre minha casa e o trabalho).
Passei a frequentar bares e restaurantes de "Santa" e não foram poucas as vezes em que desci a pé até a Glória, pois era tarde e não havia mais transporte.
O “Santa Teresa de Portas Abertas” também sempre foi um dos meus eventos preferidos.
Sempre que podia, subia de bonde e de preferência no estribo. E cantarolando a canção “Tesouros da Juventude”, de Beto Guedes:
“Pula, pega garupa, segura o bonde ladeira acima...”


Por causa dos bondinhos de lá, há tempos acalento o projeto de um livro sobre os bondes cariocas, que pretendo colocar em prática assim que o mestrado acabar.
Por isso tanta tristeza me deu ao saber da tragédia com um dos bondinhos, no último sábado (27/8). 

Uma tristeza que virou revolta ao ver no jornal de segunda-feira o tipo de manutenção dispensada ao bonde acidentado. Em uma das rodas, ao invés de um parafuso, havia um fio de metal prendendo as peças.
Isso é de uma inconsequência sem par e não há outra pena que não a de prisão para os responsáveis por esse remendo. 
Quem coloca uma gambiarra deste tipo em um meio de transporte que carrega centenas de pessoas todos os dias tem que ser acusado de homicídio doloso.
Como disse, passo muito por Santa Teresa e vejo a enorme quantidade de turistas que circula por lá. Os bondes são uma grande atração turística da cidade e não podem ser tratados com descaso.
Não faltaram alertas da associação de moradores para a tragédia anunciada que finalmente ocorreu.
Lendo o noticiário, fico ainda mais pasmo.
Há um tempo, e me lembro bem, pois noticiamos no SBT Rio (na época em que era um jornal sério) que estavam fabricando novos bondes para Santa Teresa, idênticos aos antigos. 
Na minha doce ignorância, pensei: ”Que grande ideia.” 

Buscando mais informações descobri que o contrato entre a empresa T'Trans foi assinado em 2005, mas a verba só deu para fazer sete dos 14 bondinhos previstos. E ao ler a matéria de Júlio Reis, para o UOL Notícias, descobri, através do depoimento de um funcionário que os sete bondes novos têm manutenção muito cara e não aguentam o vai e vem pelas ladeiras do bairro como os antigos, ou seja, dinheiro jogado fora. Com isso, os dois bondes velhos que ainda restam não podem ser aposentados, sob o risco do serviço parar de funcionar.
É preciso que o governo do Estado explique muito bem esta situação.
O Secretário de Transporte Júlio Lopes diz que os bandes vão parar por tempo indeterminado, até que tudo seja esclarecido.

Cabe a nós, cariocas, cobrar respostas e não deixar que esta seja uma desculpa para que os bondes sejam retirados de vez das ladeiras do bairro (o que deixaria os donos de empresas de ônibus muito felizes).
Os bondinhos amarelos têm que permanecer circulando, com segurança, com melhor estrutura, com policiamento e sem superlotação (atualmente causada pelo pequeno número de bondinhos).


Uma cidade que se diz olímpica não pode se preocupar apenas com obras futuras. É preciso também preservar o passado, no presente. 

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