Falam que brasileiros e argentinos são
rivais.
Mas se a gente olhar de perto vai ver
que estamos mais próximos do que supõe a vã rivalidade
futebolística. Até porque depois que Messi, Neymar e Suarez se
uniram no ataque do Barcelona, o Cone Sul passou a torcer pelo mesmo
time.
O amigo e mestre Ronaldo Helal, que
morou em Buenos Aires por um tempo, gosta muito de citar a seguinte
frase: “Brasileiros amam odiar a Argentina e argentinos odeiam amar
o Brasil”. Embora ressalte que antagonismos tenham crescido nos
últimos tempos, pelo menos por parte dos hermanos, num típico caso
de amor não correspondido.
Se no campo esportivo, a mídia dos
dois países prefira alfinetadas e provocações, em termos políticos
vem surgindo uma sintonia surpreendente. Vejamos...
A imprensa argentina bateu de frente e
forte com Cristina Kirchner até sua sucessão por Maurício Macri.
Os vizinhos brasileiros também caíram de pau em Dilma Rousseff, que
agora pode ser trocada por Michel Temer.
Não pretendo debater as causas desses
ataques, nem sua legitimidade. Deixo isso para analistas políticos,
que entendem muito mais do riscado do que eu. Pretendo apenas trazer
algumas curiosidades midiáticas que tenho visto por aqui.
A primeira delas me chegou através de
um pronunciamento de Cristina Kirchner sobre a semelhança entre duas
capas de revista, Noticias de la
semana e Isto É. Em destaque os supostos ataques de fúria
e descontrole das duas presidentas; de lá e daqui.
O texto da revista argentina (de junho
de 2013) fala de birra, fúria e ironia sinistra para relatar
atitudes intempestivas de Cristina com opositores e aliados que não
a defendiam. A revista ainda questionava se Kirchner não estaria
precisando de tratamento psiquiátrico.
Na coirmã brasileira (de abril de
2016) a manchete “Uma presidente fora de si” encaminha um texto
com também supostas informações sobre o descontrole da presidenta
brasileira. E logo em sua abertura deixa claro o que viria a seguir:
“Os últimos dias no Planalto têm
sido marcados por momentos de extrema tensão e absoluta desordem com
uma presidente da República dominada por sucessivas explosões
nervosas, quando, além de destempero, exibe total desconexão com a
realidade do País. Não bastassem as crises moral, política e
econômica, Dilma Rousseff perdeu também as condições emocionais
para conduzir o governo.”
A reação foi grande nas redes
sociais. Com a hashtag
#IstoÉMachismo a reportagem se tornou um dos assuntos mais
comentados naquela semana. As críticas, principalmente de grupos
feministas, eram de que a matéria reforçava o estereótipo machista
que relaciona as mulheres ao descontrole emocional, e que, por isso
mesmo, não estariam aptas a assumir cargos políticos e de
liderança.
A presidenta emitiu nota oficial sobre
a reportagem e prometeu medidas judiciais contra a publicação:
“A frase é conhecida: 'Na guerra, a
primeira vítima é a verdade'. A autoria é controversa, mas a
aplicação tem sua vertente diante de crises políticas mais agudas.
A revista Isto É tem se esforçado para trazer a máxima ao presente,
sombrear o quanto pode a verdade e jogar na lata do lixo da história
qualquer rastro de credibilidade que um dia já teve.”
Recentemente outra dessas
“coincidências” mais uma vez ligou as imprensas argentina e
brasileira.
Tema que mais movimentou as redes
sociais na semana passada, a reportagem escrita pela jornalista
Juliana Linhares para a revista Veja e intitulada “Bela, recatada e
do lar”, teve uma “irmã gêmea” do outro lado do rio da Prata.
A matéria escrita por Juliana para
descrever a possível futura primeira dama brasileira, Marcela Temer,
traçou um perfil da jovem dona de casa que pode trocar o Palácio do
Jaburu pelo Palácio da Alvorada. Um texto intrigante já que a moça,
alvo do perfil, não foi ouvida, só pessoas próximas a ela. Na
verdade, parágrafos e mais parágrafos que pareciam saídos de outra
publicação da empresa, a revista Capricho (como agora é apenas
online, não sei se ainda posso classificá-la de publicação).
Mais uma vez a mulherada brasileira fez
barulho quanto ao caráter machista da reportagem e desandou a
colocar fotos de “belas, recatadas e do lar” na Rede. Até ícones
dos anos 80 como Rêbordosa, de Angeli, reapareceram para protestar.
A matéria da Veja lembra bastante uma outra reportagem da Noticias de la semana,
só que sobre a primeira dama argentina (publicada em março de
2016). O título: “Estilo Awada Macri – O regresso da mulher
decorativa”.
Ainda na capa segue um texto síntese
do que esperava o leitor nas páginas internas:
“Deixou tudo para acompanhar Macri.
Representa o estereótipo da esposa tradicional e discreta e a
serviço do lar. O contramodelo K.” (K se refere a Kirchner)”
Ou seja, outra bela, recatada e do lar.
A reportagem pelo menos tem o mérito
de ter aspas da personagem.
E para por um pouco mais de pimenta
nessa história, neste final de semana o jornal O Globo também
fez um perfil de Juliana Awada Macri. O texto de Janaína Figueiredo
vai, no entanto por outro viés, já a partir do título: “Um
perfil político para a mulher de Mauricio Macri - Juliana Awada se
inspira em Michelle Obama em busca de um papel mais moderno”.
Sim, creiam, se trata da mesma mulher
da matéria da revista argentina. Aquela que dizia que preferia
cuidar da casa, das refeições e dos filhos.
Só que de acordo com a percepção da
repórter de O Globo pode haver um quê de coaching nesse
perfil exposto pela primeira dama vizinha; um tipo de “Obamização”.
Ou seja, forjar em Juliana uma imagem semelhante à de Michelle.
Em tempo: Janaína tentou entrevistar
Juliana Macri, mas foi barrada pelos assessores.
Será que por aqui também se pretende
algo assim?
Esperemos pelos próximos capítulos.
Afinal, ao contrário do caso argentino, aqui a faixa ainda não está
no peito do marido.
Embora a mídia assim queira, e
muito...
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