Em tempos complicados como os que
vivemos, a mídia também está na berlinda.
Se questiona, principalmente a sua
isenção.
Como hoje é o dia do jornalista, cabe
a pergunta: será que isenção jornalística realmente existe?
Com a palavra o mestre
Alberto Dines:
“O modelo de jornalismo
praticado no Brasil está esgotado... Profissionais imaginam-se
livres, empresas jornalísticas fingem imparcialidade. Arrogância,
onipotência e, às vezes, perversidade escondem- se atrás de um
pretenso senso de justiça que não resiste a qualquer avaliação
mais profunda. Com as honrosas e raras exceções. A isenção é uma
farsa, mera distribuição de barbaridades em todas as direções. O
linchamento dá-se com uma foto inocente e uma legenda pretensamente
objetiva. A goela escancarada de um âncora ou o falsete de outro são
as provas irrefutáveis de uma infração sequer investigada.
"Comunicadores" nas rádios pinçam duas linhas nos jornais
da manhã e, com elas, montam catilinárias para alimentar o dia
inteiro... A
última profissão romântica confunde-se com a mais antiga profissão
do mundo. Instituição financeiramente quebrada, tenta uma nesga de
poder. Paga muito a poucos, ungidos para celebrar suas preferências
e produzir lixo. Com as honrosas e raras exceções.”
O texto, pasmem, é de 1998. Uma coluna
de Dines para a Folha de S.Paulo. Portanto não vamos nos iludir de
que a crise atual é o motivo para os gritantes exemplos de
parcialidade na cobertura dos fatos. De ambos os lados, diga-se de
passagem. Mas como há muito mais órgãos de imprensa contrários ao
atual governo, os “causos” ocorrem em maior número.
Vejam o exemplo da foto da presidenta a
bordo de um avião da FAB em dois clichês do jornal O Globo do dia 6
de abril. No primeiro clichê, a foto continha a palavra “força”.
Já no segundo clichê a foto foi ampliada para que a palavra
desaparecesse. Por que? Será que alguém achou que a palavra “força”
daria uma conotação positiva à foto? Pessoas poderiam analisar que
o jornal estaria dizendo subliminarmente que a presidenta demonstra
força política, ou mesmo que o meio estaria desejando força a ela?
Conjecturas? Sim, claro. Mas tal
mudança nos leva inevitavelmente a elas.
Como ressalta o mestre, simplesmente
noticiar os dois lados não é sinal de isenção. Mesmo quando a
cobertura é quantitativamente igual, há o conteúdo e é aí que a
porca torce o rabo. A opinião do empresário de comunicação é a
que fala mais alto no final das contas. A cobertura vai seguir essa
linha. E, se questionados, esses mesmos órgãos usarão de critérios
totalmente subjetivos para tentar se explicar, se é que se darão ao
trabalho.
Querem um exemplo prático e recente?
A edição do Jornal Nacional do dia 5
de abril colocou no ar uma matéria sobre duas manifestações da
noite anterior em São Paulo. O VT teve 1 minuto e 52 segundos. A
parte da manifestação governista teve 52 segundos e a da oposição,
60 segundos. Na primeira parte houve uma fala de Lula com duração
de 28 segundos e na segunda parte, um “sobe som” do jurista Hélio
Bicudo com duração de 30 segundos. Divisão praticamente equânime,
não fosse por um “pequeno” detalhe. O grande fato jornalístico
do ato contra o governo foi o discurso destemperado da advogada
Janaína Paschoal, uma das autoras do pedido de Impeachment. O vídeo
viralizou na Internet, mas não foi considerado notícia pelo JN. Por
que? Caberia ao editor-chefe responder.
Link do vídeo de Janaína: https://www.youtube.com/watch?v=DrKL7NSgnNs
Link do VT do Jornal Nacional: http://g1.globo.com/jornal-nacional/videos/t/edicoes/v/duas-manifestacoes-sao-realizadas-em-sp-uma-contra-e-outra-a-favor-do-impeachment/4936548/
Uma visão neutra do que vem
acontecendo no país me parece totalmente improvável. Foram
hasteadas bandeiras, clarins soaram toques de combate há bastante
tempo e as movimentações do xadrez midiático mostram o governo em
constante posição de xeque.
Boatos viram capas, informações de
coxia também. Não importa se têm um fundo de verdade, mas servem
de carvão para alimentar a fornalha que move a oposição.
Como todos têm telhados de vidro nesse
caso, a mídia favorável ao governo também sai à caça dos
opositores, como que a dizer que quem acusa não teria moral para
isso.
E assim fica o leitor, o ouvinte, o
telespectador. Sem saber no que acreditar. Mais inclinado a
reproduzir aquele discurso que mais se adequa às suas convicções
políticas. E isso é muito ruim.
Se eu só analiso a questão por um
prisma, estarei fazendo uma análise torta. Mas, ao mesmo tempo, o
“outro lado” é tão parcial que não nos sentimos seguros em
aceitar suas versões.
Aí vira Fla x Flu.
Aí vira guerra.
É como se na sua rede social você
bloqueasse todos os amigos que têm opinião divergente da sua. O
resultado seria uma timeline monocórdica. Um samba de uma
nota só e isso não é nada bom.
Há jornalistas que buscam produzir um
conteúdo informativo decente e que, de alguma forma, tentam dar mais
equilíbrio ao seu trabalho, independente do meio de comunicação em
que atuam.
Ler/ouvir opiniões diversas sempre é
bom e (acredite!) existem colunistas bastante equilibrados, sensatos,
que se esforçam, em meio a esse caos, trazer um pouco de luz,
independente de suas posições políticas.
Já que a isenção é um mito,
saibamos, pelo menos driblar as desinformações, identificar
extremismos e buscar o equilíbrio.
Só não dá pra abrir mão do pensar.
Sem ele nada vai mudar ou, se mudar, mudará para pior.
Nenhum comentário:
Postar um comentário