quarta-feira, 4 de maio de 2011

Ilegal, e daí???

Imaginem a cena. Você chega em uma esquina do centro de uma grande cidade brasileira e repara no cenário que o cerca. Carros estacionados sobre a calçada, um mendigo dormindo sob uma marquise, camelôs vendendo DVDs pirateados, um gato de energia elétrica em uma barraquinha de cachorro quente, um anotador do jogo do bicho, lixo no chão e o cheiro da urina de algum mijão. Uma série de irregularidades “comuns” que de tão corriqueiras acabamos não percebendo mais.


Mas por que falo de tudo isso? Por que cada vez nos questionamos menos sobre o que há de errado à nossa volta. Por que estamos perdendo a capacidade de nos indignar, de protestar, de agir...

Nesta terça-feira, dia 03/05, eu e minha mulher, Fernanda, assistimos a duas reportagens do Jornal Nacional que nos espantaram. O texto da correspondente Giuliana Morrone explicava de que forma os Estados Unidos tomaram conhecimento do esconderijo de Osama Bin Laden e como se desenvolveu toda a ação, já no VT de Luis Fernando Silva Pinto vinham as explicações do governo americano para a morte do terrorista.. A cada frase uma irregularidade ianque suplantava a outra. A ver:

- As informações partiram da Base de Guantánamo, que nada mais é do que um campo de concentração americano em território cubano. Um absurdo que a comunidade internacional aceita passivamente.

- De acordo com a reportagem um dos presos falou sobre a existência de um mensageiro que fazia a ligação de Osama com a Al Qaeda depois de ser submetido a tortura. Até o ponto que eu sei, tortura é uma prática condenada pela Declaração dos Direitos Humanos.


- O porta-voz da Presidência, admitiu que a operação ocorreu sem a permissão do governo paquistanês, que Osama Bin Laden estava desarmado e que foi morto porque reagiu. Quando questionado pelos repórteres como isso seria possível, o diretor repondeu que uma pessoa não precisa ter uma arma de fogo para reagir.

Fora isso, os Estados Unidos ainda decidiram qual seria o destino do corpo de Bin Laden e o sepultaram no mar.

Longe de mim ser um defensor de Bin Laden, ou de qualquer ação terrorista. O 11 de setembro foi um dos episódios mais chocantes que já presenciei. Acho mesmo que ele deveria ser condenado à morte, mas só depois de passar por um julgamento.

Alguns de vocês podem dizer que os americanos apenas abreviaram a condenação, mas e a Justiça, onde fica nessa história. Quer dizer que dependendo da situação os direitos fundamentais podem ou não ser concedidos? E quem decide isso? O Tio Sam?

O ditador iraquiano Saddam Hussein, preso por tropas americanas foi a julgamento e, em 5 de novembro de 2006, foi condenado à morte na forca.


Por que com Osama foi diferente? Será que era melhor calá-lo?

Ainda bem que a mídia mundial tem questionado alguns pontos, embora nem todos, como a manutenção da base de Guantánamo, por exemplo. Talvez, por conta desta pressão, os americanos sejam obrigados a abrir mais o jogo, como têm feito, inclusive admitindo suas falhas e excessos. Talvez tenham que ceder à pressão e satisfazer as demandas da opinião pública.

É bom quando a imprensa pensa e não apenas publica.
É bom quando o leitor/telespectador analisa e não apenas lê/assiste.
Por isso mesmo deixo aqui uma pergunta. O mundo inteiro ouviu quando Barack Obama disse: “Justice has been done” (A justiça foi feita). Mas será que foi feita a justiça ou a vingança é que foi levada a cabo?

Os dois termos, decididamente, não são sinônimos.
 

Charge do cartunista Quinho, publicada no jornal Estado de Minas

Um comentário:

  1. Acho que a mídia brasileira cada vez mais SÓ publica, acriticamente. As coberturas são "eficientes", com o aparato tecnológico disponível hoje; porém são superficiais, pouco inteligentes, burocráticas... costumo dizer aos meus estagiários que jornalista é pago para perguntar, mas a cobertura da execução de Bin Laden desmente isso. Somente ontem, quatro dias depois (e a reboque de veículos estrangeiros), a imprensa nacional começou a "estranhar" certos aspectos da versão americana. O mundo inteiro escutou Obama dizer que a justiça fora feita - e não li, vi ou ouvi nenhum questionamento sobre esse tipo de justiça: o assassinato sumário (sem tentativa de captura), em país estrangeiro, de um homem desarmado, cujo paradeiro foi obtido por meio de tortura. Assim como não vi nenhuma reação às mortes do filho e dos netos de Kadafi, depois de ataque da Otan na Líbia - desde quando passou a ser aceitável o bombardeio sobre civis? Que a barbárie esteja disseminada, não me surpreendo. Que os Eua pratiquem há décadas o terrorismo de estado como política externa e marketing eleitoral (caçando ex-aliados convertidos em inimigos públicos, invadindo territórios estrangeiros e financiando ditaduras), nenhuma novidade. Mas que a mídia engula e reprocesse isso, sem esboçar reação, é lamentável.
    Bjos, Rafa!

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