“Medo
é o nome que damos a nossa incerteza: nossa ignorância da ameaça e
do que deve ser feito. Vivemos numa era onde o medo é sentimento
conhecido de toda criatura viva.” (Zygmunt
Bauman-2008)
Acordar
e dar de cara com a notícia: “Atentado terrorista em Bruxelas –
23 mortos” é
uma
forma muito
triste
de começar o dia. Não
bastasse, em
seguida vem a lembrança assustadora de que daqui a dois meses minha
filha estará passando pelos locais das duas explosões.
Medo.
Essa
é a maior arma do terror: o medo. Medo de, calmamente, tomar um café
e o bar explodir. Medo de estar em um ônibus, metrô ou trem e tudo
ir pelos ares. Medo de ir trabalhar e um avião atingir o prédio em
que fica o seu escritório.
Grupos
extremistas podem não ter grandes exércitos ou armamentos
sofisticados, mas têm esta arma: o medo. E enquanto houver homens e
mulheres dispostos a entregar suas vidas à causa que
lhes exige tal sacrifício,
haverá pessoas explodindo e levando com elas outras vidas. Vidas de
quem
estava no lugar errado, na hora errada...
O
ataque ás Torres Gêmeas no já distante ano de 2001 é algo que
jamais esquecerei. E olha que eu estava a muitos milhares de
quilômetros da ilha de Manhattan, mais precisamente no bairro de São
Cristóvão, na redação do SBT, onde trabalhava. Meus olhos estavam
pouco mais de um palmo distantes da tela do pequeno televisor preso
na parede quando o segundo avião atingiu um dos edifícios. Uma
imagem tão profundamente absurda que meu
cérebro demorou
para processá-la como real. Como se a visão o estivesse tentando
enganar.
A
sucessão de fatos daquela manhã do dia 11 de setembro me
deixou sem saber o que pensar. Quantos outros atentados aconteceriam?
Qual seria a reação dos EUA? Qual a extensão global que aquilo
poderia ter?.
Medo.
Estive
nos EUA menos de seis meses depois e o clima era diferente. Havia
tensão no ar.
Voltei outras vezes e a contestação é de que a
vida, por lá, nunca
mais voltou ao normal, nem voltará. Um
forte
esquema de segurança,
revistas rigorosas, raio-x de corpo inteiro, rastreamento de
vestígios de pólvora ou substâncias químicas. Exagero?
Para
quem sofreu um ataque daquela magnitude dentro de seu próprio
território, todo cuidado sempre será pouco.
Depois
do ataque ao World Trade Center, a tática terrorista
se intensificou.
Indonésia,
Rússia, Espanha, Reino Unido, Líbano, Jordânia, Egito,
Índia, Iraque, Paquistão, Dinamarca,
Noruega,
Quênia, Iémen,
Turquia,
França,
Bélgica...
Grupos
diferentes, causas diferentes, táticas diferentes, mas objetivos
comuns: alcançar visibilidade para suas causas, revidar ações militares, causar sofrimento, provocar mortes.
Medo.
Diante
de tanta barbárie, a
população,
tanto deses países afetados quanto do resto do planeta busca
explicações. Tenta entender o porquê de atitudes extremas como
essas. E
é
aí que entra a grande mídia e seu discurso quase hegemônico,
objetivo e simplificador.
O
problema
é que o mundo
está cada vez mais complexo para que nos contentemos com explicações
simplificadas. São
muitos os contextos, muitas as variáveis, muitos os filigranas. E
envolvem
não a apenas
a história
recente, mas,
sim, séculos de antecedentes de fundamental
relevância. Se o fato não é contextualizado de acordo com suas
diversas faces, inevitavelmente a compreensão do mesmo será
afetada.
Mas
será que as pessoas estão interessadas em buscar o outro lado, para
pelo menos compreender o que gera o terror? Ou preferem aceitar o
discurso do bem contra o mal, nós contra eles, patriotas contra
terroristas?
Aceitar
este discurso é o mesmo que dar carta branca para governos agirem
como bem entenderem e de acordo com interesses que vão bem além da
defesa da soberania nacional. É só ver como George Bush capitalizou
os atentados de 11 de setembro. O quadro político internacional não
é um tabuleiro de WAR. Guerras não têm apenas objetivos militares.
É
correr o risco de, sem perceber, adotar a xenofobia como discurso. É
estar sujeito ao preconceito contra seres humanos pelo simples fato
de terem feições suspeitas ou sobrenomes que remetam a regiões de
onde partem as ordens para os atentados.
Como
diz Bauman, lá em cima, o medo cresce na mesma proporção de nossa
ignorância e enquanto essa situação se mantiver, viveremos em meio
a esta trágica novela na qual mortos não terão importância por
serem quem são, mas sim pela quantidade de sofrimento que podem
gerar.
Minha
total solidariedade ao povo belga, mas enquanto enxugarmos gelo, mais
lágrimas virão.
Medo.
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