terça-feira, 29 de março de 2016

O NOME DELE É EDUARDO


Morava nos arredores da Tijuca, onde também estudava.
Não era o primeiro da classe nem o último, mas em tempos de Ditadura Militar se deu muito bem com os conceitos da disciplina Educação Moral e Cívica. Embora anos mais tarde, como veremos adiante, moralismo e civismo não se tornassem qualidades que pudessem ser atribuídas a sua personalidade.
Desenxabido, cara de nerd (coisa que não existia nos anos 1970), com cabelos compridos (moda na época) e grandes óculos. Estava longe de ser o galã da escola. Como consolo, suspirava por aquelas mulheres bonitas que apareciam na TV. Uma loira que apresentava um jornal da TV Globo, então, era sua musa...
Logo descobriu que números e cifras, principalmente, essas últimas o fascinavam. Adorava desenhar cifrões. Não sabia explicar o porquê.
Resolveu, então, se embrenhar no mundo financeiro e se formou em Economia.
Perspicaz, logo viu que dinheiro e política tinha muitos pontos em comum.
Decidiu colocar os pés no partido que sempre apoiara os militares para enfrentar os novos tempos democráticos. Queria estar próximo ao poder. Mas logo descobriu seu erro e quatro anos depois já estava do lado oposto. Encontrou lugar junto a um “gato angorá” felpudo como uma raposa que depois de uma derrota eleitoral tentava chegar outra vez ao governo do estado.
O sucesso do parceiro rendeu experiência política e matreirice a Eduardo. Se destacou e atraiu a atenção de outras soturnas figuras da política nacional. Tanto que na primeira eleição presidencial direta depois de tantos anos de noites sombrias, estava embarcado em um partido nanico que levaria um colorido caçador de marajás ao planalto central. Colou com o careca, homem-forte do moço de Maceió e ganhou de presente o comando de uma estatal.
Era muito dinheiro passando na sua frente. Muitos cifrões (aqueles que ele adorava) dependendo apenas de uma canetada e um carimbo seus. As propostas indecorosas também eram muitas e como Eduardo não era de ferro, cedeu. E cederia muitas outras vezes. Tanto que logo se tornaria um velho conhecido de ministérios públicos e de tribunais de contas.
Por onde passou deixou sua marca.
Com grana no bolso, a aparência não importava mais. Casou com a loira da TV (não aquela, mas outra).
Como sempre foi bom de fazer amizades (nem sempre com amigos bons) ganhou um microfone para falar ao povo de Deus. Independente de seus atos suspeitos, sempre se fez de bom moço e tomou como slogan a defesa da vida e da família. Pelas ondas do rádio troava um discurso que exigia respeito para o povo, quando ele mesmo não se dava ao respeito.
O papel de defensor dos bons costumes foi interpretado com tanta maestria que dos parcos 15 mil votos em sua primeira tentativa nas urnas, passou a mais de 130 mil na eleição seguinte.
Em Brasília, se sentiu em casa. Descobrira seu lugar. Tinha poder e as bençãos da impunidade. Mergulhou fundo nos meandros regimentais e passou a usá-los com maestria. O cargo lhe proporcionava recursos para fazer crescer seu rebanho eleitoral.
Não era mais criança, mas ficou muito amigo de um garotinho, que também fez questão de presenteá-lo com um cargo que pudesse beneficiar os dois.
Hoje estão brigados (pelo menos na frente das câmeras).
Sua votação não parou mais de crescer, ultrapassando a casa de 200 mil no último pleito.
Ganhou poder junto aos colegas e passou a não mais esconder seu status financeiro de ninguém. Regabofes caríssimos em Paris, Lisboa ou Miami, por que não? Exorbitantes mimos de grife para a patroa e a filha no Champs Elysées? Claro que sim... Para que serve o dinheiro afinal? Ainda mais quando o dinheiro não é seu...
Pego mais uma vez com as calças na mão em maio a um lava-jato, fez cara de bom moço, criou desculpas e se encastelou junto a aliados e à burocracia do poder legislativo para resistir o máximo que puder. Municiado com artigos, alíneas, parágrafos e interpretações do regulamento interno, vai se mantendo no comando e pilotando o processo de retirada da pedra que impede que seu partido volte a governar o país.
A oposição finge indignação, mas aceita o fato, pelo menos enquanto tiverem o mesmo propósito.
Eduardo mostra calma e mantém o sorriso da empáfia. Afinal, quem sabe os amigos não chegam logo ao poder e tudo não acaba em pizza novamente. Aliás, pizza não, porque Eduardo há muito tempo não come mais pizza. Prefere um Poulet-de-Bresse-coquillettes-au-jus et truffe noire, acompanhado de uma taça de Louis Roederer, Brut Premier.

Com você pagando a conta, é claro!

PS: Trata-se de um texto de ficção, mas que está mais para história de terror.


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