terça-feira, 15 de março de 2016

POESIA NUMA HORA DESSAS, SIM SENHOR...

Fiquei na dúvida se escrevia este texto.
O céu carregado dos últimos dias, o ceticismo instalado, os nervos à flor da pele, a desesperança... Será que numa hora assim dá para falar de algo poético?
Na dúvida, decidi que sim.
No último sábado tive a alegria de assistir a um dos mais singelos e belos shows dos últimos tempos.
Em “Cartola: um poeta da Mangueira”, a portelense de carteirinha Teresa Cristina revive os versos de Angenor de Oliveira, um baluarte da Música Popular Brasileira.


Quem não conhece direito a obra de Cartola pode até achar que exagerei na última frase, mas basta assistir ao show para se certificar de meu juízo (e de muito mais gente muito mais abalizada do que eu). As canções vão sucedendo, uma mais bela que a outra, uma mais conhecida do que a outra. Músicas que viraram sucesso nas vozes de outros sambistas e até na de quem só foi beber desta fonte bem depois, como Cazuza que, por sinal, era quase xará de Cartola. Se chamava Agenor e ao descobrir a quase coincidência se embrenhou pelo repertório do Angenor mangueirense levando para o público do pop nacional a poesia nascida no morro.

“Ouça-me bem, amor
Preste atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos, tão mesquinho
Vai reduzir as ilusões a pó”
(O mundo é um moinho – Cartola)

Teresa Cristina foi muito feliz ao definir como seria a homenagem ao compositor. No palco, apenas ela e o violonista Carlinhos Sete Cordas. Nada mais era preciso.


A voz de Teresa e os acordes de Carlinhos encheram o Teatro Net Rio. Um teatro com apenas meia casa, apesar de todos os ingressos terem sido vendidos. O temporal daquela noite impediu que muita gente conseguisse chegar. Mas nem toda a chuva, nem todos os percalços foram suficientes para tirar o brilho da noite.
A cada composição, a constatação do valor da poesia em nossas vidas.

“Só você violão
Compreende porque perdi toda alegria
E no entanto meu pinho
Pode crer, eu adivinho
Aquela mulher
Até hoje está nos esperando
Solte o teu som da madeira
Eu você e a companheira
Na madrugada iremos pra casa
Cantando...”
(Cordas de aço – Cartola)

Como seria sem graça o mundo sem a música, sem as letras de Cartola... Um homem simples que soube, através de sua simplicidade, traduzir sentimentos tão complexos.
O clima era de uma comunhão tão grande que Teresa, no bis, atendeu ao pedido de um mangueirense da plateia e cantou “Sei lá, Mangueira”, uma ode à verde e rosa composta por outro portelense, Paulinho da Viola.

“Em Mangueira a poesia
Num sobe e desce constante
Anda descalço ensinando
Um modo novo da gente viver
De sonhar, de pensar e sofrer”

Saí mais feliz, mais leve e com a esperança de que tudo há de melhorar...

“Finda a tempestade
O sol nascerá
Finda esta saudade
Hei de ter outro alguém para amar
A sorrir
Eu pretendo levar a vida
Pois chorando
Eu vi a mocidade
Perdida”
(O sol nascerá - Cartola)

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