terça-feira, 9 de agosto de 2016

OLIMPITACOS IV

Poucas horas depois da judoca Rafaela Silva ganhar sua medalha de ouro começou a circular nas redes sociais uma postagem afirmando que apesar de ser negra e ter crescido numa favela (sic), teria conseguido tudo por mérito próprio, sem feminismo, sem cotas e por ser militar.



Vamos destrinchar essas afirmações...
Não vou falar nem na questão do feminismo; deixo isso para amigas com mais argumentos do que eu.
Em relação ao resto e sem querer tirar qualquer mérito de Rafaela, temos que lembrar que ela só começou a lutar Judô através de um projeto social comandado por Flávio Canto. Não fosse essa oportunidade, tão rara para jovens de comunidades carentes, possivelmente não se envolveria com o esporte.
A qualidade técnica de Rafaela Silva e sua determinação lhe abriram outras portas e fizeram com que pudesse ser agraciada com a Bolsa Atleta, distribuída pelo Governo Federal. Uma dessas bolsas tão criticadas pelos defensores da meritocracia.
E por fim, um acordo entre os ministérios do Esporte e da Defesa propiciou que a judoca entrasse nas Forças Armadas como militar temporária através do Programa Atletas de Alto Rendimento (PAAR).
A grande vantagem desse Programa é que além do soldo militar e da estrutura de treinamento, os atletas podem ter outras fontes de recursos, como a bolsa atleta e patrocínios de empresas.

O Brasil já teve diversos militares de carreira competindo em Olimpíadas. Nosso primeiro medalhista de ouro foi o tenente Guilherme Paraense, que disputou o Tiro nos Jogos de Antuérpia, em 1920.



Em Helsinque, em 1952, nosso porta-bandeira foi o primeiro-tenente Mario Jorge da Fonseca Hermes, integrante da seleção de Basquete.



Mas o quadro existente hoje com 145 atletas militares entre os 465 que integram a nossa delegação nos Jogos de 2016 é bem diferente dos que havia em outros tempos.

Por conta dos Jogos Mundiais Militares, realizados no Rio de Janeiro em 2011, traçou-se uma estratégia de atração de atletas como o PAAR, acima citado. A meta era que o Brasil conseguisse um bom desempenho em casa. Objetivo, por sinal, alcançado. Foram  114 medalhas: 45 de ouro, 33 de prata e 36 de bronze e o primeiro lugar na competição.
Só para se ter uma ideia, antes desse programa, a participação brasileira era pífia. Em 2007 o país havia conquistado apenas duas medalhas de prata e uma de bronze.

Nos Jogos Militares do ano passado também tivemos grande desempenho na Coreia do Sul. Ficamos em segundo lugar, com 84 medalhas. Dessas, 73 foram conquistadas por atletas que já fizeram parteou estão atualmente na Seleção Brasileira de suas modalidades e na Rio 2016.
A Rússia venceu a competição com 135 medalhas e A China ficou em terceiro com 98 (14 a mais do que o time brasileiro), mas com menos ouros (34 a 32). Os dois países também têm diversos atletas militares. Os Estados Unidos, maior potência olímpica do planeta e que não vincula suas modalidades às Forças Armadas com tanta ênfase, ficou apenas em 23º lugar.

A participação de atletas militares, portanto, quase triplicou de 2012 para cá. Em Londres eram apenas 51 e eles só competiram em 12 modalidades. Nos Jogos do Rio os integrantes do Programa competem em 27 modalidades. No judô 100% dos atletas são militares do quadro temporário do Exército e da Marinha.


Entre os novos atletas adotados pela Aeronáutica está Arthur Zanetti, primeiro brasileiro a conquistar medalha olímpica na ginástica artística, nas Olimpíadas de Londres, em 2012.

É claro que tanto Exército, quanto Marinha e Aeronáutica se aproveitam do bom desempenho dos atletas para a melhoria da imagem das instituições. As duplas de praia, por exemplo, usam tatuagens com o símbolo da força que defendem. E é cada vez mais comum ver atletas batendo continência nos pódios. Normal, já que se tratam de militares, mesmo que não de carreira.



O que não dá é assistir calado a grupos de direita querendo impor uma falsa verdade. Ainda mais se a postagem vem de um grupo de Facebook chamado "Bolsonaro Viril".
Podem me chamar de preconceituoso, mas eu acho que quem cria um nome como esse não parece estar interessado apenas nos dotes políticos do nefando deputado.

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