quinta-feira, 29 de julho de 2010

Abundância poética

Passando pela Rede vi uma foto de Drummond e resolvi investigar se havia uma página sobre o poeta. Logo de cara o Google me indicou um site montado pela editora Record, que tem os direitos de publicação de sua obra. (http://www.carlosdrummonddeandrade.com.br/ )
Lá estão fotos, dados biográficos, trechos de prosa e algumas poesias, que comecei a reler.
Por último estava esta que se segue abaixo.

A bunda que engraçada
1930 - O AMOR NATURAL


A bunda, que engraçada.
Está sempre sorrindo, nunca é trágica.

Não lhe importa o que vai
pela frente do corpo. A bunda basta-se.
Existe algo mais? Talvez os seios.
Ora – murmura a bunda – esses garotos
ainda lhes falta muito que estudar.

A bunda são duas luas gêmeas
em rotundo meneio. Anda por si
na cadência mimosa, no milagre
de ser duas em uma, plenamente.

A bunda se diverte
por conta própria. E ama.
Na cama agita-se. Montanhas
avolumam-se, descem. Ondas batendo
numa praia infinita.

Lá vai sorrindo a bunda. Vai feliz
na carícia de ser e balançar.
Esferas harmoniosas sobre o caos.

A bunda é a bunda,
redunda.

Talvez o maoir mérito de Drummond (pelo menos para mim, que não sou crítico literário) tenha sido esta capacidade de refletir sobre questões tão profundas do ser humano e ao mesmo tempo ser um poeta-cronista, atento ao mundo exterior E se levarmos este poema em conta, digamos que o poeta mineiro deve estar um bocado satisfeito com a localização de sua estátua, no calçadão de Copacabana, onde milhares de bundas vão e vêm.



Ao ler o poema, imediatamente me lembrei de um trecho do livro "Carnaval no Fogo", de Ruy Castro (Leitura indispensável para quem ama esta cidade). Em dado momento, ele fala do Rio de Janeiro como cidade feminina que é, e do hábito bem carioca de se apreciar um belo bumbum.

"Alguém já contabilizou, digamos, o número de horas-ano que os homens das cidades femininas consomem em virar a cabeça para admirar de soslaio o derrière de uma mulher por quem acabaram de passar?

Eis aí uma prática que, com mais ou menos soslaio, o carioca elevou à categoria de arte. E, como toda arte, gratuita: deleitar-se com um par de quadris em ação (e passar adiante, sem convidar a mulher para um drinque ou para um motel) é um ato que não faz parte de nenhuma cadeia produtiva, nem gera um só centavo. É a arte pela arte mesmo. Em compensação faz com que, por alguns minutos, o dia deles melhore consideravelmente; e o da cidade, por ser palco desse gesto que deixou duas pessoas mais felizes. Para as cidades de temperamento feminino, isso é suficiente...

É rara uma semana em que um anúncio, um desenho, uma foto nos jornais não explore os contornos físicos da cidade, associando-os aos de uma mulher: as curvas do Pão de Açúcar e da Urca lembrando a cavidade da cintura e a linha dos quadris; o morro Dois Irmãos se transformando num par de seios; as luzes da praia de Copacabana sugerindo um colar de pérolas..."
E emendando uma referência na outra, não dá para não pensar nas lindas charges de Lan, o chargista italiano "mulatófilo", autor de algumas das nais belas representações da mulher brasileira.

Poderíamos falar também das canções que exaltam a bela anatomia da mulher, como "A vizinha do lado", de Dorival Caymmi.


"A vizinha quando passa

Com seu vestido grená
Todo mundo diz que é boa
Mas como a vizinha não há
Ela mexe co'as cadeiras pra cá.
Ela mexe co'as cadeiras pra lá.
Ele mexe com o juízo
Do homem que vai trabalhar"



Clique no link e assista a Chico e Dorival cantando a Vizinha (no bom sentido).

http://www.youtube.com/watch?v=X6yqD1NQnBk


Não são poucos os exemplos, mas acho melhor pararmos por aqui.


Caras leitoras, espero que não vejam este post como machista. Tratou-se apenas de um encadeamento de raciocínio onde uma ideia levou a outra, ou, se preferirem, onde uma bunda levou a outra.

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