quarta-feira, 21 de julho de 2010

Alô, mídia brasileira... Aquele abraço.

Pergunte a um pauteiro, seja ele de que veículo for, quantos releases abarrotam suas caixas de e-mails todos os dias. Todos jurando novidades, fatos jornalísticos relevantes. Todos buscando algumas linhas, alguns segundos preciosos junto à opinião pública.


Cabe a estes pauteiros selecionar o joio do trigo, o que nem sempre é uma tarefa fácil. Além disso há a pressão da chefia para fechar não sei quantas matérias para o dia seguinte e aí é que o bicho pega. A equação matemática não fecha:

poucos profissionais + muito trabalho + pouco tempo = falta de apuração adequada


Some-se a isso uma terrível opção da mídia pelas matérias engraçadinhas, pelo entretenimento, ou como diriam os teóricos, pelo "fait divers", e teremos um resultado jornalístico um tanto quanto duvidoso.



Foi com esta mesma opinião que o jornalista Ricardo Kauffman decidiu fazer um documentário mostrando como a mídia brasileira, ávida por "gracinhas", compra pautas pra lá de suspeitas. Ele criou um personagem chamado Ary Itnem ( leia ao contrário e entenda a escolha do nome) e ensaiou um artista para que este desempenhasse o papel de um executivo de Relações Humanas, representante de uma suposta Confraria Britânica do Abraço Corporativo (CBAC).


Tudo começou com um vídeo na Internet em que Itnem aparecia com um cartaz, na avenida Paulista , pedindo abraços. Virou febre no Youtube e pauta nas redações. Para a grande imprensa foi vendida a ideia de que o abraço corporativo era o remédio para a "inércia do afastamento, provocada por um mundo cada vez mais tecnológico".



A partir do primeiro meio de comunicação que comprou a história, como numa fila de dominós, outros meios foram caindo; caindo na mentira armada por Kauffman. E não foram apenas blogs ou sites de menor expressão. Grandes jornais, emissoras de rádio e de TV comparam a história e deram a ela um espaço bastante considerável.
O curioso é que nenhum deles pensou em checar a tal Confraria. Se estava no release, era verdade. Se outros órgãos de comunicação deram, era verdade...
O diretor chegou a dar uma chance aos jornalistas que decidissem apurar a história. No site fake que criou para a CBAC dizia que todas as informações sobre a Confraria estavam registradas em um cartório paulistano. E estavam mesmo. Lá, o jornalista deixou uma carta explicando que tudo não passava de uma brincadeira.
Alguém checou? Alguém teve tempo de checar?
Pois o nosso Ary Itnem ficou famoso. Foi chamado até para dar palestras motivacionais. Graças à mídia, que agora tem que vestir a carapuça e ver o documentário "Abraço Corporativo" expor suas fraquezas. (veja o trailer: http://oglobo.globo.com/cultura/video/2010/18755/)


Todos nós, coleguinhas, deveríamos assistir a este documentário, prontos para fazermos um mea culpa. Quem sabe as próximas reuniões de pauta não serão um pouco mais rigorosas...

Veja mais sobre o documentário na reportagem do programa Metrópolis da TV Cultura:






3 comentários:

  1. Oi Rafael. Eu adoro pautas. Fazer, pesquisar, selecionar e pensar no repórter ideal para cada uma.
    O que vi ao longo da carreira é que os chefes de reportagem só fazem os que outros fazem. Parece tudo um comboio, igualzinho.
    Tudo bem que o dia a dia exige, mas é preciso ousadia. E tem tanta coisa maravilhosa para se mostrar.

    Boa quinta. Abraço.

    ResponderExcluir
  2. Pois é Lili, mas na correria da redação, e com quadros cada vez mais enxutos, a produção vai empobrecendo e se padronizando, no mau sentido do termo. Esta ideia do Kauffman é maquiavelicamente boa. Um tapa na cara do nosso jornalismo. Só que, infelizmente, acho que vai tudo continuar como está....

    ResponderExcluir
  3. Olá Rafael,

    Essa pauta é antiga. Alguém já copiou essa ideia de alguém. Veja esse link: http://www.youtube.com/watch?v=vr3x_RRJdd4. Eu já passei esse vídeo várias vezes em sala de aula.
    É contagiante!
    bjss

    ResponderExcluir