terça-feira, 9 de abril de 2019

BOLA FORA


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Quem dera se tivéssemos uma chave em nosso cérebro que pudéssemos desativar nosso preconceito; um disjuntor que pudesse ser desligado e nos manter livres de qualquer tipo de discriminação.
Infelizmente, por mais que nos esforcemos para evitar esse tipo de coisa, vira e mexe nos flagramos com pensamentos tacanhos que, infelizmente, estão entranhados em nós. Afinal, são séculos de cultivo de ervas daninhas como se plantas viçosas fossem.
Sendo assim, o que nos cabe, é exercitar constantemente a empatia com o próximo. Duelar com um ideário conservador que a todo momento se mostra fortemente presente, mesmo em pleno século XXI. A discriminação social, racial, de gênero, de opção sexual e de credo tem raízes profundas e brota a todo momento. Tanto que no fértil terreno das Redes Sociais, por exemplo, a verborragia preconceituosa e ofensiva ganhou status de praga, de peste. Por isso mesmo, nos cabe resistir.
Porém, mesmo pessoas mais esclarecidas que conscientemente repudiam tais raciocínios arcaicos, podem reproduzir preconceitos armazenados no perigoso e escorregadio subconsciente.
Foi, a meu ver, o que houve como o técnico de vôlei Bernardinho, um profissional reconhecido mundialmente por sua competência, mas também pelas reações extremas à beira da quadra. Quem o vê dando entrevistas quase não pode acreditar que seja a mesma pessoa que, durante os jogos, xinga, vocifera, se descabela e quase tem um surto apoplético.




Pois foi em um desses seus desabafos que Bernardo Rezende pisou na bola. Depois de mais um ponto marcado pela jogadora trans Tiffany, que atua pelo SESI-Bauru, o treinador carioca foi flagrado pela câmera na hora em que pronunciava a frase: “Um homem! É foda”.


É claro que quase imediatamente o assunto viralizou. Afinal tratava-se de Bernardinho, multicampeão com as seleções nacionais e uma figura admirada por atletas e torcedores.
Após seu time, o SESC-Rio de Janeiro, ter sido eliminado da Superliga, com uma grande atuação de Tiffany, Bernardo tentou dar um contexto esportivo para o desabafo. Disse que se referia ao "gesto físico e ao controle físico", características dos atletas masculinos.

O time de Bauru preferiu tirar Tiffany do centro da confusão e informou, apenas, que os dois já haviam conversado e que tudo estava bem.


Não estou aqui para condenar o treinador. Não creio que seja um sujeito mal intencionado, mas acho que ele perdeu uma ótima oportunidade de fazer um mea-culpa que, no final das contas poderia ser um desfecho positivo para o episódio. Poderia ter dito que, infelizmente, o preconceito nos cerca de tal forma que acabamos sendo contaminados por ele, mesmo que não queiramos. Acho que explicitar a questão dessa forma poderia servir de alerta para todos sobre a facilidade com que podemos nos deixar levar, ainda mais de cabeça quente.
PS: O leitor pode até achar que é injusto ter uma jogadora transexual em campeonatos femininos, por ainda possuir características físicas masculinas (embora haja jogadoras mulheres que são até maiores do que ela), mas essa é uma discussão que já houve e Tiffany foi autorizada a participar de competições. Bola pra frente, ou melhor, pro alto.

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