Quando eu era criança, lá pelos idos dos anos 1960, a
Scuderie Le Cocq era famosa no Rio de Janeiro. Um grupo formado por policiais
que agia fora dos limites impostos pela lei para “controlar” a criminalidade.
Seus métodos nada ortodoxos logo fizeram com que também fosse conhecida como o
Esquadrão da Morte.
Meio século depois, com o crescimento do tráfico, a ideia de
ter policiais, e até bombeiros, agindo “por fora” para garantir a segurança da
população voltou a ganhar fôlego. O exemplo de Vila das Pedras, em Jacarepaguá,
primeira comunidade a adotar o sistema, passou a se espalhar.
Só que as novas “autoridades” do pedaço, para garantir a
tranquilidade do local, passaram a cobrar um tipo de imposto mensal de
comerciantes e moradores. Depois passaram a monopolizar alguns serviços. Galões
de água e botijões de gás tinham que ser comprados com eles, por preços mais
altos, claro. Serviço de TV a cabo, tinha também. O famoso Gatonet.
Daí a conseguir eleger candidatos ligados a eles, foi um
pulo.
Com a falta de repressão das autoridades, muitas delas com
ligações íntimas com esses grupos (exemplos recentes mostram que deputados empregavam
parentes de milicianos em seus gabinetes), a milícia carioca se expandiu.
É certo que várias prisões de chefes desses grupos e de “soldados”
da milícia foram realizadas. Só que, como no caso do tráfico de drogas, deixaram
a coisa alcançar um estágio difícil demais de ser debelado.
Hoje são vários grupos de milicianos que, tal como os
traficantes, loteiam pedaços da cidade. E o pior, todas essas facções de
bandidos, sejam do tráfico ou de farda, disputam territórios entre si, deixando
a população em meio ao fogo cruzado, como aconteceu esta semana na Praça Seca, na
Zona Oeste.
Essa região, a maior do Rio, por sinal, é a preferida dos
milicianos. É lá que expandem seus domínios sob o pulso frouxo da Prefeitura e
do governo do Estado e a complacência de alguns setores da Justiça. Um exemplo
é a construção de edifícios em áreas irregularmente ocupadas. Eles simplesmente
tomam posse e ai daquele proprietário que tentar reclamar.
São prédios de até 10 andares de altura, sem qualquer
vistoria dos órgãos públicos, sem qualquer tipo de garantia estrutural e sem escritura.
A preços mais baixo que os de mercado, acabam encontrando compradores, apesar
de tudo e de todos.
Os prédios que desabaram na comunidade do Muzema eram assim.
E se podemos ter uma certeza é de que, apesar da tragédia,
outros serão construídos e habitados. Afinal, para as autoridades que estão à
frente da Cidade e do Estado ou para alguns juízes, esses devem ser problemas
corriqueiros.
E, na pior das hipóteses, sempre dá pra acusar a imprensa de
estar fazendo drama demais.
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